quinta-feira, 3 de outubro de 2013

Tem culpa eu?

Atualizando o post anterior, "Inteiro – e não pela metade":

Após o site do Globo mostrar, em vídeo, um PM que aparentava forjar flagrante na Cinelândia, pincei dois comentários, de um escritor e de um jornalista, sobre o episódio. Um dizia "Interessante: o vídeo foi veiculado na tal da "imprensa vendida". Assim como o furo sobre o assassinato do Amarildo". O outro, que "O vídeo é bom pra mostrar como age a polícia e pra acabar com essa palhaçada de imprensa vendida (termo que ele parece ter usado como ironia)".

Quanto à vã esperança do cara, disse que a "palhaçada da 'imprensa vendida'" não vai acabar. Por mais que O Globo se esforce para se mostrar progressista, será sempre feio, sujo e malvado, um inimigo do povo, para quem sabe como ser legal.

A confirmação do que eu disse não demorou a se mostrar. Pouco após O Globo dar o furo sobre o inquérito que aponta tortura como causa da morte do pedreiro adotado como símbolo político dos que, se não fosse por isso, nem se lembrariam da notícia sobre ele e mostrar o PM na Cinelândia provavelmente forjando o flagrante, um amigo, escritor, postou no feice um texto chamado "a mídia, os artistas, o medo e o silêncio" – já com mais de mil curtidas e compartilhamentos, em que acusa os tais de serem culpados por "criminalizar os protestos" e abrir "espaço para a porrada da polícia no povo".

Artistas e intelectuais são acusados de se silenciarem, mas me concentro na imprensa, a qual o JP chama de "mídia" e acusa assim:

"você, articulista de jornal, rádio e tv, que ajudou a criminalizar os protestos e abriu espaço para a porrada da polícia no povo: a culpa é sua.

você, editor preguiçoso, que jamais contou o número de manifestantes feridos, mas sim o número de cacos de vidro no chão: a culpa é sua./p>

você, repórter, que fechou uma matéria sem ouvir nem sequer um manifestante, comprando a versão da PM como fato depois de décadas de assassinato e abuso: a culpa é sua.

É deveras curioso acusar um repórter virtual de estar "comprando a versão da PM" logo após O Globo mostrar, no flagra do rojão, exatamente o oposto disso. Mas, se o texto multicompartilhado não mostra nenhum exemplo concreto do que diz, eu mostro do que digo:

O que abriu espaço para a porrada, desde as primeiras manifestações de grande porte, em junho, em São Paulo, foram crimes de fato cometidos por militantes, tais como depredar estações de metrô e... espancar um policial militar – sim, ele foi a vítima, não o algoz.

Uma olhada na outra notícia a que me referi na postagem anterior – lamentando que ela não tivesse recebido a mesma atenção que o rojão – ajuda a saber porque repórteres vêm fechando matérias "sem ouvir nem sequer um manifestante": os "manifestantes" não deixaram, logo, a culpa é deles, não da repórter da CBN. A não ser que se ponha nela a culpa por ter sido xingada, ameaçada e quase agredida (o que a PM, aí, fazendo corretamente seu trabalho, impediu) quando... tentava ouvir manifestantes na Cinelândia. Não faltam exemplos anteriores, seja de não responder aos pedidos de entrevista e hostilizar, seja de, muito democraticamente, expulsá-los de locais públicos. Em outro exemplo recente, no 7 de setembro, o repórter Júlio Molica, da mesma Globo News que transmite o Estúdio I, foi ameaçado e ainda acusado de estar "arriscando a vida pela Globo", por um câmera-comentarista daquele pessoal fora do eixo e dentro do dinheiro público que se diz "ninja". De fato, muita gente ficou caladinha sobre essa covardias; por aqui elas não passaram batidas.

É evidente que ações e reações violentas de PMs (que "mais hábeis em arder os olhos de quem tem a ver com a questão do que em prender os culpados" ou ausentes também não passaram batidas aqui e não chegam nem perto dos piores capítulos de suas histórias) se seguiram. Achar que seria possível não ocorrerem em meio a tamanha turbulência é tão realista quanto crer em gnomos. Uma simples vista nas páginas de jornais, como O Globo de hoje, mostra que as páginas e imagens televisivas quase sempre tem mostrado como se fosse da PM a iniciação da violência, que geralmente parte dos tais "manifestantes" – É, aliás, o que percebem, em seus Observatórios da Imprensa pessoais, pessoas comuns, de psicanalistas e engenheiros a porteiros e garçons dos pés-sujos da rua do Riachuelo – gente mais ligada em sua própria percepção e consciências individuais (e em sua necessidade diária de ganhar o pão de cada dia) do que em ser legal.

Só mais um Silvas que a estrela não brilha, como os atendentes de lanchonetes apedrejados por milicianos mascarados em 12 de agosto e a designer cujo ônibus só não foi incendiado um mês antes, no Flamengo graças à ação... da PM. Tem culpa eu? Quem quiser achar que ache, que eu não escrevo para agradar ninguém.

Segue agora a postagem anterior:

Das organizações Globo, o que, felizmente, foi muito mostrado e o que, infelizmente, não foi.

"Interessante: o vídeo foi veiculado na tal da "imprensa vendida". Assim como o furo sobre o assassinato do Amarildo"

"O vídeo é bom pra mostrar como age a polícia e pra acabar com essa palhaçada de imprensa vendida"

São interessantes os comentários, de dois jornalistas, em um postagem de outro no Facebook. O primeiro diz tudo – exceto pelo fato de o pedreiro estar desaparecido, não havendo confirmação de assassinato. No segundo, me parece claro que o autor se referiu à "imprensa vendida" de forma irônica, negando a acusação, embora não tenha posto o termo entre aspas.

*(Legenda no final do texto)

O vídeo em questão foi gravado e publicado pelo site do jornal O Globo, das Organizações Globo, que muito frequentemente vêm sendo atacadas e tendo seus profissionais xingados, agredidos e ameaçados pelos milicianos de cara encapuzada (ou nem isso) em suas manifestações pacíficas de pedradas, pauladas e coquetéis molotov.

Suas imagens mostram um policial com um morteiro na mão antes de abordar um militante, na Cinelândia, após a votação do Plano de Cargos e Salários dos professores da rede municipal carioca. Em seguida, mostram o mesmo PM deixando o morteiro no chão, enquanto a mochila do então suspeito é revistada. Após a revista, o mesmo PM sai empunhando um morteiro, o qual apresenta como suposto flagrante, após ele e outro colega de farda darem ordem de prisão ao mochileiro

A sequência não mostra o PM pegando de volta o morteiro que havia jogado no chão, mas é possível vê-lo – atrás de um cameraman aparentemente também militante – se abaixando durante a revista, na qual não é mostrado nenhum morteiro e nenhuma outra arma sendo encontrada na mochila. Se as imagens não podem confirmar 100% que ele forjou o flagrante, deixam muito próxima essa constatação, completada depois pelo fato de o rapaz não ter sido indiciado, o que certamente teria sido, caso portasse explosivo – combinação de prova material com circunstancial.

O Globo fez muito bem ao dar o furo sobre a conclusão do inquérito, no que pese a dúvida, trazida a mim por outro jornalista, sobre uma indicação de tortura por asfixia sem cadáver para exame de corpo de delito. Como fez muito bem também ao gravar e publicar o vídeo e mostrar a todos uma postura péssima da PM, que não é novidade.

Mas a "palhaçada da 'imprensa vendida'" não vai acabar. É da natureza dos homens-massa que usam o termo odiar a imprensa que consideram "vendida": ou seja, que não publica só e exatamente o que o partido ou movimento deles quer que seja publicado – é o que seus ídolos chamam de "democratização da mídia", em uma realização da novilíngua com cuja perfeição Orwell não conseguiria nem sonhar, mas que os socialistas realizam. É a "democracia" de partido único e jornais somente os aprovados (aliás, escritos) pelo partido – que chama a si próprio de "povo" (não por acaso, tais militantes tentaram cassar indiretamente o voto do povo carioca, impedindo o trabalho de vereadores democraticamente eleitos por todos).

O vídeo do Globo, felizmente, foi compartilhado inúmeras vezes. Essa outra notícia é de uma repórter da rádio CBN, das mesmas organizações Globo, que foi xingada, ameaçada e que não só foi agredida covardemente por um bando de milicianos socialistas que se atribuem a primazia de decidir quem pode ou não trabalhar em um espaço público porque, dessa vez, a PM fez a coisa certa e não permitiu que uma pessoa fosse atacada por uma bando. Esas, infelizmente, foi muito pouco compartilhada.

*Legenda: contra esse pacífico manifestante na foto de Silvia Izquierdo, da Associated Press, nem a ministra dos Direitos Humanos, Maria do Rosário, nem a Comissão de Direitos Humanos – cujo presidente, Wadih Dahmous, homenageou o corruptor José Dirceu – disseram nada.

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