Promoção do Racismo
E não é que o secretário municipal de Promoção da Igualdade Racial (sic) de São Paulo Netinho de Paula, do PC do B, ganhou um concorrente à altura (não na voz irritante melosa das babas no Negritude Jr.)?
Promotor criminal de São Paulo, Christiano Jorge Santos projeta racismo nos outros e acha que deve intervir na escolha sobre quem apresenta o sorteio dos grupos da Copa do Mundo e abriu inquérito por não ter gostado do boato de Lázaro Ramos e Camila Pitanga, supostamente indicados pela TV Globo, serem preteridos por Fernanda Lima e Rodrigo Hilbert.
O casal de louros já apresentou sorteios da Fifa, como o do logo da Copa de 2014 e sua escolha é normal sob qualquer avaliação que não se baseie em preconceitos, mas o promotor vê racismo na federação internacional de futebol ou na Geo Eventos, organizadora da festa, na despeito das escolhas de Alcione, Olodum e mais quatro músicos negros para os shows do evento: Vanessa da Mata, Emicida, Alexandre Pires e Margareth Menezes.
Acusar a Fifa – talvez a entidade com mais campanhas antirracistas no mundo – só faz sentido no raciocínio de quem trata músicos como escravos: “o branco fica na casa grande e, o negro, na senzala. A apresentação ficou para o apresentador de olho azul. O batuque ficou com o negro”, diz Santos.
“Afirmaram que não são racistas por causa dessas escolhas. Para mim, isso só reafirma o tom racista nessa questão”, exacerba o promotor.
Na melhor das hipóteses, seria uma dedução tão inteligente quanto a do fofoqueiro profissional Leão Lobo, que via no entusiasmo de Thiago Lacerda ao beijar Vanessa Lóes o oposto do que a imagem mostrava: seria a prova de que o ator era gay e pegava a mulher de jeito só para disfarçar.
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Se, em vez de Margareth, a Geo optasse por Claudia Leitte – não obstante a maior popularidade desta última –, o promotor poderia usar a loura para reforçar sua tese. Como as evidências são em contrário, entretanto, ele alega que 6 (seis!) atrações musicais foram escolhidas só para disfarçar o racismo. Trata os elementos não como objeto de análise para conclusão posterior, mas como escravos do triunfo da vontade de sua ideia pré-concebida.
O que é discriminatório, senão tal desprezo ao trabalho que artistas fazem com prazer?
(Acima, músicos que Santos compara a escravos. Que expressões sofridas e infelizes, não?)
Que pessoa, em plena sanidade mental, compara um palco a uma senzala? Quem que conheça um músico não sabe que viver de sua paixão, ao inverso de qualquer trabalho forçado, é o sonho de milhões? Ou os percussionistas do Olodum, por acaso, são castigados a manter o ritmo sob chicotadas? De quem, senão do promotor, vem o tom pejorativo de tratar como reles “batuque” trabalhos que incluem a orgulhosa potência vocal de uma Alcione?
Só que ele ainda vai mais fundo, ao dizer que os atores [Lázaro e Camila] representam de maneira mais adequada a composição étnica e racial do povo do Brasil, ao passo que os atores escolhidos, Fernanda Lima e Rodrigo Hilbert, de raça branca/caucasiana, sob tal aspecto, não.
Santos erra até dentro de seu próprio – e péssimo – critério: com 46,2% de brancos, 45% de pardo e 8% de pretos, segundo o IBGE, o Brasil tem 80% de DNA europeu. Mas é um critério que nem merece consideração. Há 80 anos, o pessoal que mandava e dizia representar os alemães dizia que as pessoas de raça judaica não representavam de maneira adequada a composição étnica e racial do povo da Alemanha. As consequências que conhecemos foram reflexo de tais ideias.
A ausência de qualquer base científica é, de longe, o menor de seus males. Exatos 50 anos após o mais célebre discurso de Martin Luther King Jr., o promotor julga quem é mais ou menos adequado conforme a cor de suas peles.
Adaptada da coluna publicada originalmente hoje, 4 de dezembro de 2013, no jornal Destak, em tamanho. Os trechos em itálico são acréscimos ao conteúdo impresso.
PS.: os lourinhhos à esquerda são o filho do casal, que, para o promotor, "não representam" o Brasil e não são "mais" adequados para apresentar o sorteio da Copa.
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