terça-feira, 3 de junho de 2014

Festa na Papuda

Hoje é festa lá no CPP. Sem Barbosa, batem outra vez com esperanças os corações dos mensaleiros de saírem da cadeia antes do prazo legal. Já vai terminando a gestão do presidente do STF que, em tal cargo, não poderia capitular ante ameaças que, segundo amigos, aceleraram sua saída. Serviram, porém, para mostrar o caráter duplo da militância que se diz “pelas minorias” e usou insultos racistas tão logo Joaquim podou asas dos bons companheiros.

As gentilezas foram de “capitão do mato” (NR: negro que caçava escravos foragidos) a “negro vadio” que “a Dilma deveria (...) meter ele numa cadeia”. Para se ter uma ideia, o Ministério Público investigou a Fifa por suposto racismo – devido a cogitar Lázaro Ramos e Camila Pitanga como apresentadores do sorteio de grupos da Copa, mas optar pelo casal Fernanda Lima e Rodrigo Hilbert, com os quais já havia trabalhado –, mas não moveu uma palha contra a campanha racista difamatória dos seguidores dO Partido. A Seppir – secretaria da Presidência, com status de ministério – também não fez nada, claro, tal como o movimento negro ligado ao PT. Racismo contra os inimigos pode.

A tese mais repetida pelos fãs de corruptores, para os quais Barbosa já vai tarde do STF foi a de que ele teria condenado o deputado cassado José Dirceu (PT-SP) – por quem a galera companheira mais violenta tem verdadeira tara – baseado somente na Teoria do Domínio do Fato, isto é: sabia do que ocorria, estando em posição de liderança.

É tão verdadeiro quanto a vasta cabeleira do corruptor Dirceu. Felizmente, como relator do julgamento do mensalão, Barbosa não deixou passar que o então ministro-chefe da Casa Civil de Lula participou diretamente das negociações para a obtenção de empréstimos pelo publicitário Marcos Valério, para bancar o mensalão – compra de apoio parlamentar para o governo de então.

Ou, como Rogério Gentile encarnando, na “Folha”, o espírito de boi sonso de seus fanzocos, “não existem tantas provas contra Dirceu. É só uma grande coincidência, por exemplo, ele ter se reunido com Valério e dirigentes do BMG num dia e o banco ter liberado recursos para o mensalão dias depois”.

A saída de Barbosa embala o decreto presidencial que impõe conselhos “populares” (de militantes) aos órgãos públicos e o anúncio do PT de que buscará regular a mídia, revogar a anistia e reformar a política, a partir de 2015. O poder “normal” não é suficiente, para quem diz que “não vale nossos governos indicarem ministros do Supremo, e eles chegarem lá e votarem contra” – o senador petista Jorge Viana (AC), deixando claro o plano de tornar o Judiciário um apêndice do partido.

Na semana passada, meu amigo Márvio dos Anjos, diretor editorial do Destak, indagou se valeria manter a Lei da Anistia, sem julgar casos como o de Rubens Paiva? Lembrando que ela perdoou crimes tão brutais quanto da esquerda que só visava a outra ditadura, sim. O contrário será submeter a lei ao triunfo da vontade de quem está no poder – vide agora o Egito.

Aí, vale tudo o que lhes favorecer, como mostra o mimo desse integrante da comissão de ética do PT-RN: “Contra Joaquim Barbosa toda violência é permitida, porque não se trata de um ser humano. Ele deve ser morto”.

(Ampliada da coluna publicada hoje, 4 de junho de 2014, no jornal Destak. Acréscimos ao original impresso em itálico).

Servolo se escondia sob o codinome Antonio Granado.

terça-feira, 20 de maio de 2014

Volta, Lula. E volta a nado

Na Coreia do Sul, onde os impostos tomam 26,8% do PIB, a presidente Park Geun-hye curvou-se, em rede nacional, para pedir desculpas pelo naufrágio com pelo menos 286 mortos – a maioria, crianças que viajavam em uma excursão da escola pela costa próxima à capital Seul –, apesar de a tragédia ocorrer em excursão escolar privada e de o órgão estatal acusado de lentidão no socorro às vítimas – a guarda costeira – não ser diretamente ligado à Presidência.

No Brasil, onde a carga tributária bateu recorde de 37,65% em 2013, o ex-presidente Lula falou na semana passada do estádio de seu time Corinthians, que só foi construído por influência dele, ainda no Planalto, e só ficará (?) pronto para a abertura da Copa com R$ 400 milhões dos bancos estatais BNDES e Caixa – financiamento amplamente anunciado desde novembro, apesar do qual Lula continua fingido que "não há dinheiro público" para a construção de estádios.

Em vez de desculpas pelo atraso nas obras e pelos três operários mortos na construção (1/3 do total de nove mortes, nos 12 estádios da Copa), insultos contra quem criticou o acesso do Itaquerão à estação de metrô. Não deve ser mesmo agradável se expor andando à meia-noite, após futuros jogos do time, mas, para o ex-presidente, reclamar disso é querer “ir até dentro do estádio” e pedir uma melhor infraestrutura de mobilidade é “babaquice”.

"Vai a pé, vai descalço, vai de bicicleta, vai de jumento, vai de qualquer coisa. Mas o que a gente está preocupado é que tem que ter metrô, tem que ir até dentro do estádio? Que babaquice é essa?"

A voz do povo é a voz de Deus, mas só para aplaudir o Narciso, que, sob vaias, até foge, como fez, deixando de fazer a abertura os Jogos Pan-americanos em 2007, no mesmo Maracanã que sediará a final da Copa do Mundo – e que, aliás, tem metrô quase na porta.

Infelizmente, de modo geral, tem funcionado: a uma plateia de blogueiros chapa branca bancados com dinheiro público por estatais e governos do PT e de aliados, o soberano diz que "exigimos é que haja neutralidade e seriedade nas informações", enquanto a própria imprensa a qual ele e seus companheiros chamam de "oposição" reproduz fielmente sua afirmação falsa de que "não há dinheiro público" (sic), sem desmenti-la para informar corretamente os leitores.

Felizmente, O Implicante lembra o que ele disse há quatro invernos:

“Se o Brasil não estiver pronto para Copa, volto a nado da África".

Será que essa promessa ele cumpre?

(Artigo ampliado da coluna publicada originalmente em 21 de maio de 2014 no jornal Destak. Trechos acrescidos em itálico)

quarta-feira, 14 de maio de 2014

Não vote, estude

Se novas pesquisas mudam perspectivas eleitorais, uma certeza é inabalável para 5 de outubro: a despeito de acharem radicais minhas posições liberais, familiares pedirão-me dicas sobre em quem votar – especialmente para deputados, sobre cujos candidatos saberão quase tanto quanto sobre as escalações da seleções de Irã e Bósnia na Copa.

Não é promessa de candidato: como Seu Creysson, agaranctho que, neste ano, não recomendo votos. E nem é vingança por não lerem Ludwig von Mises, Hayek ou Bastiat antes de atacar o que parece tão estranho ao senso comum, mas por convicção de que o conhecimento formador de opções sinceras é pessoal e intransferível.

Nesse fim de semana, 57% dos entrevistados pelo Datafolha disseram que, se pudessem, nem iriam votar. Se mal conhecem os candidatos e partidos é o melhor que fazem. Escolher o “menos ruim” exige conhecimento que, se por quatro anos, você não teve curiosidade de adquirir, é porque não se importa tanto assim – e nem será de véspera que o conseguirá. Se esse é o seu caso, fique em casa ou vá à praia.

“Por que recomendar a alguém que ‘vá ler mais’?”, questionou, na 2ª-feira, meu amigo Vinícius Albuquerque, editor de SP. Solta, a premissa é pura insinuação de ignorância – localizada, na verdade, em quem a profere, por não saber nem dizer o que (nem por que) ler. O oposto é recomendar determinada leitura ou estudo, por saber que ela acrescentará – há pouco, recebi tal recomendação, de gente inteligente e sincera. Agradeço e me esforçarei.

Publicado originalmente no jornal Destak de 15 de maio de 2014. Reproduzido com alguns acréscimos

quarta-feira, 23 de abril de 2014

Hoje é festa lá no DCE

Abro esta coluna com o alemão Friedrich Nietzsche (1844-1900), para quem era “preciso proteger os fortes dos fracos”, contra a “doença do niilismo”. Volto a outro filósofo, o pernambucano Luiz Felipe Pondé, com quem abrira a coluna da semana passada: coincidentemente, na segunda-feira, bombou seu artigo ressaltando que, no Brasil, “ser jovem e liberal é péssimo para pegar mulher”.

Alvíssaras no outro mundo encantado! O reassa entregou que seus pares não pegam nem resfriado! Houve quem lesse até confissão de inépcia própria: “Pondé anuncia celibato!”, manchetou o (mais involuntariamente) humorístico “Piauí Herald”, sobre o cinquentão e seu texto iniciado com “ser jovem”.

Para usar o linguajar mimético das redessociais, “só que não”... A referência extratextual em outros artigos do casadão Pondé situa a incompetência, tal como a covardia intelectual, onde elas estão: na mediocridade, que “é enturmada e anda em bando”.

Como “as [pessoas] menos dotadas odeiam as mais dotadas”, para livrar-se da maldição dos fracos, convém não ser forte – no sentido intelectual e de personalidade. Quem xinga muito no Twitter contra a existência de intolerantes como Pondé, pratica o puro “Marketing do Bem” por ele definido: não tem “a coragem de alguns de resistir às glórias de fazer parte da torcida e do rebanho”. Como diz o neo-odiado Lobão, “o frouxo unido jamais será indivíduo”. E tal qual nos filmes adolescentes americanos, necessita ser popular.

Originalmente publicada no jornal Destak em 23 de abril de 2014.

PS: reparem no link para o livro do Grande Lobo que ele vaticina "Mas querem saber de uma coisa? Foda-se a patrulha!", pouco antes da frase citada. É, não para quem mendiga curtidas no feice...

PS 2: Esses mesmos que apelam para o marketing pessoal do bem na rede, aproveitando o dia de hoje, podem fazer que nem São Jorge na festinha do DCE, encarando aquela suvaquenta para dizer que pega alguém – quem odeia o Pondé pode adotar o grande pensador Dadá Maravilha como filósofo de cabeceira, melhor que os livre-docentes da USP...

quarta-feira, 9 de abril de 2014

Caravana Rolidei

O ano era 2007, o mês era agosto e a capital do Acre já concorria com outras 11 cidades a ser uma das sedes da Copa que o Brasil só ganharia o direito de sediar em outubro. Embaixador da candidatura de Rio Branco, José Wilker deu aula sobre o segundo ciclo da borracha, que quase o fez o nascer acreano, pois seu pai saíra do Ceará para virar seringueiro.

A condição de a cidade sediar jogos de Copa do Mundo, porém, pode ser resumida pela cheia que há duas semanas bloqueia a BR-364 e corta sua única ligação rodoviária com o resto do país, levando o Governo do Acre a decretar calamidade pública – vale a pena ver a reportagem do Jornal Hoje de ontem, em que a equipe acompanha um caminhoneiro por 38 horas no percurso de Porto Velho a Rio Branco, de 490 km normalmente percorridos em oito horas.

A aventura inclui espera por balsa para atravessar a área alagada e tráfego 'normal' em um trecho da estrada que se transforma em um charco, com água a mais de um metro de altura, tornando a rodovia invisível por baixo da carreta.

O que por terra empaca, pelo ar não decola e leva o presidente da Infraero, Gustavo do Vale, a assumir que vai “tapear as obras de modo que você melhore a operacionalidade sem terminá-las como um todo”, ao assumir que o aeroporto de Confins, na Grande BH, não ficará pronto até a Copa, assim como os de outras cinco cidades-sede do torneio: Porto Alegre, Fortaleza, Curitiba, Salvador e Cuiabá.

Em Porto Alegre, com apenas 1,85% da obra feita, o terminal de passageiros terá sua reforma concluída somente no próximo ano, mas o trabalho todo ainda dura mais dois anos, vai até 2016.

Fortaleza, por exemplo, não teria o aeroporto reformado nem se sediasse os Jogos Olímpicos: só termina em 2017. Mas só fica indignado quem não sabe que Gustavo disse apenas o óbvio.

Vem sendo tapeado quem quer, desde 2007. O próprio Confins tinha plano de privatização desde 2008. Em agosto de 2012, Dilma Rousseff o trocou por parceria público-privada – mais ideologicamente aceitável – com empresas estrangeiras. Só que ninguém quis e o leilão foi feito em novembro de 2013. O vacilo é óbvio, exceto para otimistas como Aldo Rebelo, que devem crer até em neve no Brasil – cuja infra aeroportuária segue tão moderna quanto a Caravana Rolidei.

Publicado originalmente no jornal Destak, em 9 de abril de 2014. Trechos adicionais em itálico.

PS: a rigor, há neve no Brasil, tanto quanto pode haver aeroportos entregues no prazo pela Infraero. Depois de fechado, pensei que seria melhor trocar "Brasil" por "Sertão do Brasil", mas a página já havia ido para a gráfica. Como diria Ritchie, a vida tem dessas coisas – acrescento eu: especialmente quando se trabalha em jornal, que não tem a flexibilidade da internet para alterações a atualizações. The End.

quarta-feira, 2 de abril de 2014

Ao Destak

Quem hoje ergue o cálice

“Eu decido quem pode participar”, berrou o militante do PCO ao tentar impedir o trabalho do repórter Caco Barcellos, da TV Globo em uma das manifestações “pacíficas” de junho passado. “Eu sou o povo!”, gritava, com todo seu espírito democrático. De lá para cá, só piorou e até morreu gente, de tanta conivência”.

Na última sexta-feira, a PGR aceitou denúncia do PC do B contra Rachel Sheherazade, âncora do SBT, por achar “até compreensível” reação do grupo que prendeu um ladrão adolescente pelo pescoço. É bem diferente de justificar, mas o partido inventa que ela estimula as pessoas a “sair por aí julgando e executando” e quer ver a opinião dela “investigada”.

A legenda criada para elogiar o legado de Stálin, que executou milhões por crimes de opinião, pode levá-la ao destino do colega José Neumanne Pinto, crítico do Planalto recém-demitido.

Os 50 anos do golpe caem como luva para a militância que, desde antes, só queria uma outra ditadura, de sinal trocado. Não à toa, hoje apoia o uso de médicos cubanos sem o direito sequer de ir-e-vir e com o salário quase todo apreendido pelo regime dos Castro e, no mínimo, se omite sobre mortes e denúncias de tortura na Venezuela.

Você pode até achar que isso tudo é democracia “até demais” e que a ameça vem de 1 (um) deputado ou 1 (um) professor, não das turbas que, cheias de Gramsci e vazias de Voltaire, lhes deram um “cale-se!” aos gritos. Pensando bem, ontem foi o dia perfeito para isso.

Publicada originalmente em 2 de abril de 2014 no jornal Destak

PS: No jornal impresso, a frase "eu sou o povo" saiu como "eu sou povo", o que pode ter confundido seu sentido, da arrogância de se colocar no lugar de quem decide pelos demais

PS2: Outra enorme ameaça foi aquele arremedo pífio de marcha 2.0, bem resumido por Felipe Moura Brasil

Amnésia alcoólica

“Derramar cachaça em automóvel é a coisa mais sem graça de que eu já ouvi falar. Por que cortar assim nossa alegria, já sabendo que o álcool também vai ter que acabar?” Quando fez a pergunta em uma música de 1979, Raul Seixas não poderia imaginar que 35 anos depois o barato alcoólico acabaria mais caro para a presidente Dilma pagar, com o dinheiro do goró alheio, por sua promessa de conta de luz mais barata.

Semana passada, lembrei que o horror com o preço da cerveja no bar bacana que se frequenta por opção contrasta com a indiferença com os impostos extorsivos que se pagam sem opção. Embriagada de otimismo, essa gente boa veria tudo duas vezes, só não enxergaria o óbvio agravamento nos investimentos das empresas energéticas pelo corte forçado – como ainda creria até na existência de ônibus grátis.

Transparente como petróleo, o governo diz agora que a Petrobras só pagou a parte da ex-sócia na compra da refinaria de Pasadena por ter contestado a rentabilidade dela. Desse papo de bêbado se acorda ao se lembrar que, na verdade, a belga Astra Oil resolveu sair da sociedade por não aceitar a imposição da construtora brasileira Odebrechet nos projetos de nossa petrolífera estatal.

O aumento não será tão grande quanto o que a Petrobras precisou bancar pela infelicidade que ela mesma procurou, mas o possível aumento de impostos sobre a cerveja, na qual eles são 56% do preço – e cuja arrecadação cresceu 50% em três anos –, prenuncia uma ressaca.

Publicada originalmente no jornal Destak em 26 de março de 2014

Pior que um mensaleiro

Depois que o STF reloaded extinguiu crime de formação de quadrilha, nenhum político vai pegar prisão em regime fechado pelo mensalão, mas, se depender do governo companheiro de José Dirceu, você pode não escapar – basta deixar de declarar alguma renda, para o coordenador-substituto da Receita, Jorge Caetano, que quer dar oito anos de cadeia ao crime de sonegação fiscal, equiparando-o ao de corrupção.

Em português claro, o mesmo governo que fez a maior corrupção parlamentar da história deste país quer te tornar potencialmente tão criminoso quanto quem usa o seu dinheiro para pagar propina a deputados – bastando um lapso ao declarar o IR, aquele processo tão simples quanto responder à esfinge.Salve Jorge, que o governo anda pobre! Só bateu o recorde de arrecadação em janeiro, mas os R$ 123,7 bilhões foram pouco, menos que a Receita esperava.

O brasileiro trabalha, em média, cinco meses só para pagar impostos, mas o ministro Guido Mantega está achando pouco, por isso cogita aumentá-los neste ano – já que reduzir a inflação não é mesmo com ele.

Enquanto se horrorizam com o preço da cerveja pseudogringa no bar bacana, os ativistas do bem nas redessociais praticam sua eterna quaresma sobre a carga tributária e seu bicampeonato 2012/2013 de recordes em proporção no PIB. Há seu sentido, até porque quem mais a sofre bebe é Brahma no pé-sujo, mas os bons companheiros ameaçam simular qualquer um de ser pior que um mensaleiro.

Publicada originalmente no jornal Destak em 19 de março de 2014

quarta-feira, 12 de março de 2014

Chorume intelectual

Que Paulo Barros? Joãozinho Trinta é que era visionário, vide agora, depois de 25 anos, a evolução da Sapucaí às ruas de seu enredo “Ratos e Urubus, Larguem Minha Fantasia”. E com o Aterro do Flamengo adereçado de Novo Gramacho, escorreu do estrato social habituê de seus blocos hype o chorume cultural favorável ao atentado violento à limpeza urbana. Dos teclados de seus modernos smartphones, batucaram gritos como “não limpa!”, ao lado de fotos de belas viagens à Europa.

Enquanto isso, moradores de bairros pobres como Rio das Pedras tinham morros de lixo na porta de casa até ontem. No apoio político, o dualismo foi exposto em ditos como o do deputado federal Jean Wyllys (PSOL-RJ), que perguntou “Escolta? Estão tratando garis como bandidos!” e acusou o “governo que os escraviza” – como se não fossem cidadãos livres, que prestaram concurso para a profissão a qual podem deixar quando quiserem, protegidos por essa escolta dos que cometiam o crime de ameaça para intimidá-los a não trabalhar.

Já quando a cubana Ramona Rodríguez deixou o Mais Médicos, no qual ganhava até menos do que um gari e precisava pedir permissão a um agente de seu governo ditatorial para se deslocar no Brasil, o mesmo parlamentar zombou dos colegas “de direita” que a acolheram, por “acusar os médicos cubanos do Mais Médicos de “escravos”” – culpa que eles jamais imputaram a ela, a vítima.

Joãozinho Trinta era mesmo um visionário. Sabia que (pretensos) intelectuais gostam da pobreza (alheia), para usá-la.

Publicada originalmente no jornal Destak, hoje, 12 de março de 2014.

terça-feira, 25 de fevereiro de 2014

Fantasia das ruas

O bloco do Baixo Augusta revoltou-se com a detenção de repórteres pela PM de São Paulo com a mesma urgência com que reduziu a “acidente” o homicídio de um outro, no Rio, por seus queridos milicianos encapuzados – e olha que, enquanto os jornalistas da capital paulista foram liberados sem problemas, como todos os 262 detidos, o que ocorreu ao cinegrafista Santiago Andrade é naturalmente irreversível.

A justa cobrança pela punição dos bem contabilizáveis abusos policiais em protestos, como o relatado pelo fotógrafo que se feriu e teve o equipamento quebrado, contrasta com o silêncio sobre esses mesmos jornalistas terem precisado se fantasiar de blocs para não serem vítimas destes. O fenômeno ocorre graças à covarde complacência com que bandos decidam quem pode ou não ficar em locais públicos, absurdo ululante que nos últimos oito meses foi mascarado de normalidade.

Só uma amiga minha levou três “duras” das novas otoridades do poder paralelo, em torno da praça da República, na região central paulistana, questionada sobre se era P2 (PM de serviço reservado) infiltrada – como se fizesse sentido a noção de ‘infiltração’ em um espaço que é... público.

Há, porém, quem ganhe (bem) para dizer que os “jovens” estão “arrebentando e quebrando” porque suas pautas “não são ouvidas”, como a relatora especial da ONU Raquel Rolnik, na “Folha de S.Paulo”, com a mesma lógica de quem aceita uma surra na mulher de malandro por não pôr a janta na hora – e ainda repete os dados de que veio de PMs a maioria das agressões a repórteres, omitindo que esses precisam se disfarçar para não serem perseguidos por seus “jovens”.

A mesma edição da “Folha” mostra que “atender as ruas” é o oposto do que fantasia sua colunista, também professor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP. Nela, uma pesquisa do Datafolha aponta o menor apoio aos protestos desde junho (52%), em uma queda puxada por aqueles que ganham até dois salários mínimos, entre os quais os contrários (49%) já superam os favoráveis (43%).

O que acontece é que teóricos de gabinete – conforme definidos por Edmund Burke – nada entendem de pessoas reais e só enxergam o tal povo por trás das alegorias ideológicas que os tornam as colombinas de seus enredos. Mas, livre das máscaras que lhes imputam, quem não consegue voltar para casa porque um protesto à base de rojões e coquetéis molotov contra policiais – ou quem estiver na frente – fechou a Central do Brasil ou avenida Presidente Vargas já parece cansado de servir, à revelia, como porta-bandeira de moleques mimados e violentos que não aceitam o contraditório.

PS: que o digam os passageiros da linha 474 (Jacaré-Jardim de Alah) que, nem aí para o aumento anual da passagem o qual serviu de desculpa para as primeiras manifestações ‘espontâneas’, deixaram claro à militante profissional conhecida por Sininho, com sua camiseta dizendo “Favela não se cala”, que ela não era bem vinda ali – o direito de negar alguém a entrar em um ônibus é o mesmo de proibir a permanência de repórteres em espaço público (nenhum), mas ali, pelo menos, a atitude foi, de fato, espontânea, e não um espasmo de totalitarismo político.

Adaptado e ampliado da coluna publicada hoje, 26 de fevereiro de 2014, no jornal Destak.

terça-feira, 18 de fevereiro de 2014

À procura do Capitão Gancho

Na trama de J.M. Barrie, Peter Pan é um garoto que se recusa a crescer. No Brasil atual, a PM cumpre o papel do capitão Gancho, mas quais pensamentos bons fazem nossa linda juventude voar quando o vilão oficial não se confirma na vida como ela é?

A mágica da sustentação dissimulada a militantes violentos para tirar a culpa pelo homicídio de um cinegrafista vai de apontar o dedo à PM como maior agressora de jornalistas – omitindo que estes precisam se esconder de “manifestantes”– a iniciante dos confrontos – uma piada involuntária que qualquer um que os cobriu sabe ser tão real quanto uma nota no valor da passagem de ônibus no Rio*.

No entanto, nenhum factoide superou o de tentar apagar a conivência dos arautos da Primavera Carioca, comprovada por suas próprias declarações – por mais que as tentem apagar à soviética, como fez Edilson Silva, da executiva nacional do Psol.

Na Terra do Nunca das redessociais, o clamor não é por uma investigação séria da denúncia de financiamento à violência, mas por enterrá-la a priori, junto com a declaração do suspeito preso de que temia ser morto por “pessoas envolvidas nas manifestações” – e sem nenhuma moção de apoio ao fotógrafo que escondeu a identidade pelo mesmo motivo, após registrar o rojão mortal.

"Com medo de represálias, por ter sofrido ameaças nas ruas durante os protestos, ele preferiu gravar sem mostrar o rosto e sem que o nome dele fosse divulgado", mas foi simplesmente ignorado pelo Sindicato dos Jornalistas, tratado como uma "impessoa".

De volta do conto de fadas, não foi o aumento anual da tarifa – pretexto para o advento das depredações – que revoltou os passageiros. Com a frase “favela não se cala” na camiseta, a militante apelidada Sininho viu usuários do ônibus 474, vindo da favela do Jacaré, abrirem a boca para chamá-la de “patricinha hipócrita”. Não foi por R$ 0,25. Foi contra quem só quer usá-los politicamente.

(Ampliada da coluna originalmente publicada hoje, 19 de fevereiro de 2014, no jornal Destak, sob o título 'Capitão Gancho'. Trechos contínuos em itálico foram acrescidos ao texto original).



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Faixas-bônus

PS:Pouco antes, a mesma, que já chamara um PM de “macaco”, servira de escudo para um companheiro dessa turma cujo lema é ‘Não tem arrego!’ que, após ameaçar outro cinegrafista(“espero que você seja o próximo”).

*PS 2: o mesmo princípio se aplica contra revisionismos retóricos como o do livre-docente da USP que, na Folha de S.Paulo, atribui

à polícia todas as outras mortes em manifestações desde julho, porque se deveriam unicamente às vítimas estarem fugindo de policiais, como se não houvesse nem a hipótese de os conflitos terem sido iniciados por tentou furar bloqueios policiais e os atacou com bombas caseiras e coquetéis molotov.

E isso quando os policiais militares não são os alvos primordiais de espancamentos, como o do coronel Reynaldo Rossi, em outubro, em São Paulo – quando um dos agressores foi indiciado por tentativa de homicídio – e de outro PM no Rio de Janeiro, ainda em junho.

PS 3: Não é à toa que o Lobão titulou seu segundo livro como Manifesto do Nada na Terra do Nunca, sobre este país que se recusa a crescer.

quarta-feira, 12 de fevereiro de 2014

O que não tem explicação

Sabe onde o bando que prendeu um ladrão adolescente pelo pescoço com uma apertada trava de bicicleta foi chamado pela primeira vez de "grupo de criminosos"? Foi na editoria de Brasil do Destak. Independente de seus antecedentes, os envolvidos passaram muito da legítima defesa, já estando ele rendido.

Chamar as coisas pelo que são deveria ser simples, mas nem sempre tem sido. Condenar sem mais delongas a violência de ditos "manifestantes" custa a expulsão do Clube das Pessoas Legais e interrompe o sonho dourado das Jornadas de Junho.

No Rio, o deputado estadual Marcelo Freixo (PSOL-RJ) disse, após a morte do cinegrafista Santiago Andrade, da Band, que "nada justifica a atuação violenta de manifestantes". Concordo; é pena ele ter dito há cinco meses não ser “juiz para ficar avaliando os métodos em si”, quando questionado sobre Black Blocs. Um julgamento negativo poderia ajudar a freá-los então.

O Sindicato dos Jornalistas do Rio tenta "aproximação" com "manifestantes" para "dirimir a hostilidade nas ruas", enquanto acusa Rachel Sheherazade, âncora do SBT, de "apologia à violência", por achar "compreensível" o que houve no Aterro do Flamengo.

Então em campanha, a atual presidente do sindicato, Paula Máiran, disse que repórteres serem "expulsos ou mesmo agredidos nas manifestações de rua (...) tem explicação". O que não é compreensível nem tem explicação é por que criminosos revidarem a outro criminoso seria menos compreensível do que criminosos agredirem trabalhadores. Mas dizer isso pega mal.

PS: o padrão prosseguiu no desfile da Independência, em 7 de setembro, no Rio de Janeiro, quando, após o repórter Júlio Molica da Globo News ser covardemente agredido e ameaçado de morte – ainda que de forma indireta – por um bando que se autointitula "ninja", o sindicato publicar um texto a respeito cujo "lide da nota sequer cita as agressões cometidas por manifestantes", escondendo-a no pé do artigo e tentando transferir a culpa da agressão aos veículos de comunicação, como ressaltou Fernando Molica, jornalista e pai de Júlio, sobre esses "meninos mimados e violentos que não suportam o contraditório".

Adaptado da coluna publicada originalmente no jornal Destak, em 12 de fevereiro de 2014. O PS em itálico não está no jornal, foi acrescido em seguida.

terça-feira, 21 de janeiro de 2014

Ó mundo tão desigual

O relatório da ONG Oxfam dizendo que 1% da população detém 50% do PIB mundial encheu de bondade os corações dos amigos do povo. O deputado federal Fábio Trad (PMDB-MS) , por exemplo, postou a notícia três vezes em dois dias seguidos, em sua conta no Twitter.

Já o produtor Pablo Capilé, conhecido por não redistribuir a bandas que tocam em seus festivais a parte que lhes caberia do patrocínio com dinheiro público atacou, via Facebook, “gente que acha que isso é normal, é livre mercado, é meritocracia”.

(A parte musical, feita pelos Paralamas, é bacana)

PS: O relatório da Oxfam merece, contudo, ser lido, tanto pela parte involuntariamente cômica, como os elogios à própria autodeclarada bondade da ONG, que define há "70 anos trabalhando para combater a pobreza e a injustiça", quanto por quando escreve certo por linhas tortas, como logo antes, na mesma página 12, ao afirmar que "os mercados não são entes autônomos e espontâneos que funcionam segundo suas próprias leis naturais. Na realidade, são construções sociais com leis estabelecidas por instituições e reguladas por governos". De fato, como pelo mesmo acaso Capilé acertou, de fato, iniciativa privada regulada a fórceps pelos governos que tomam cinco meses de trabalho dos indivíduos de todas as faixas de renda, via impostos, e criam infindáveis dificuldades para a atividade econômica não tem mesmo nada a ver com livre mercado.

A ONG boazinha abre esse capítulo denunciando uma "Manipulação do sistema em favor das elites". Os ungidos do bem gostam tanto de culpar uma tal 'elite' e de denunciar alegadas manipulações do 'sistema' quanto de omitir que, de fato, são uma ONG milionária (entre tantas outras, aliás), que faz parte da elite econômica e que o nº1 desta é o aparato estatal, do qual defendem a ampliação. É o máximo do paradoxo, mas a confusão é essencial para o propósito.

Como explicou o advogado Bernardo Santoro, diretor do Instituto Liberal, "provavelmente 1% da humanidade controla 90% dos Estados"

Se o deputado está preocupado, poderia distribuir 80% de seu salário de R$ 26,7 mil, que o põe quase cinco vezes no topo – se você ganha mais de R$ 5,5 mil por mês, já está no 1% mais rico, segundo a Ricam Consultoria.

A ação faria sentido para ele agir conforme prega, mas só teria efeito além disso para quem acha que riqueza é algo estático, para ser dividido e que um só fica rico tirando de outro e que a miséria seria fruto da ganância alheia – crença mais cafona do que a letra (mais especificamente, na parte do refrão) do ex-ministro – ele próprio, aliás, um milionário morador de um apartamento gigantesco com vista para a praia de São Conrado, que cobrou cachê de R$ 600 mil para cantar no réveillon de Salvador – em uma festa organizada pela mulher dele.

Qualquer estudo razoável da história ensina que a pobreza é o estado natural do ser humano e que a riqueza precisa ser produzida, em processos que beneficiam a todos, dos quais o mais óbvio foi a Revolução Industrial, que permitiu a pobres terem uma roupa por dia, pela primeira vez.

Em um exemplo mais recente, a proporção de lares brasileiros com acesso à banda larga subiu 30% em um ano e chegou à maioria (55%), conforme pesquisa Nielsen Ibope. Isso é livre mercado e é bom para todos, menos para os que vivem de consumir dinheiro público e, por isso, não se importam com o aumento de 9,33% na carga tributária em dois anos.

Artigo ampliado da coluna de 22 de janeiro no jornal Destak. Parágrafos acrescidos ao original em itálico.

PS: Errei. O texto original saiu com um erro de edição ("dizendo que 50% do PIB mundial detém 1% do PIB mundial") que foi corrigido posteriormente neste blog.

<h1>Viagem ao fundo do Rio</h1>

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